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CAMPO & CIDADE

Livros à mão cheia

Setembro, dia 28, Livraria o Sebo, Joinville, mais um livro de David Gonçalves no prelo. Desta vez: Algo Rói no Peito. Contos. E como sempre cirúrgicos. Na veia.

O poeta Castro Alves, em outros idos já predissera: ”Oh, Bendito quem semeia/ Livros...Livros à mão cheia.../ E manda o povo pensar!/ O livro caindo n’alma,/ É germe que faz a palma./ É Chuva que faz o mar”.

Assim é David Gonçalves, livros à mão cheia, mais de trinta obras publicadas. Contos e romances enfileirados. Ah, e contos infantis, uma
raridade na literatura brasileira. “Por Seus Olhos, Sapatos de Capim, Adorável Margarida, A mulher Barbada, A Vaca no Quarto Andar.

Lembra, em certo sentido, David Gonçalves, o realista Aloísio de Azevedo... O Cortiço. Corta fundo, espécie de navalha afiada, evoca assim
o romance A Carne, de Júlio Ribeiro. E outra navalha igualmente mortal, de Plínio Marcos: Navalha na Carne.

Sejamos, entretanto, realistas: nada mais, nada menos, do que a realidade crua e nua é o que retrata David Gonçalves. Arco de pua
corcoveando na madeira. E boa serragem na ponteira.

De estilo conciso, faz questão de ressaltar: brasileiros já leem pouco, imagine , então, se o autor rebusca. Fodeu-se a paca velha.
Mas, ali estávamos: admiradores, escritores. E leitores. Coincidências das coincidências, e que maravilha! Roteiro pianístico. Sim, uma jovem tocava piano. Clássicos afloravam no ar, sustenidos e bemóis no ambiente. Manhã agradável. Dona Silvia, uma espécie de mecenas da literatura confabulava com a Beth da Academia Joinvilense de Letras. O roteiro de piano acontece uma vez por ano em todo mundo todo.
Louvável inciativa. Coisa de sétima edição. Sabia disso, não! Coisas boas, acontecem. Bom demais.

E David, lá estava, ouvidos de mercador. Aplausos. A cultura, de certeza, faz toda a diferença. Bernadéte Costa discorre sobre a obra em tela, o livro de contos Algo Rói no Peito. Destaca o prefácio de Gilberto Mendonça Telles, poeta maior da geração de 1945. “No panorama da literatura brasileira, a obra de David Gonçalves, ocupa lugar especial e de relevo; é uma das mais importantes da ficção, estamos no mesmo nível de escritores consagrados”.

Maria Cristina presidente da Academia Joinvilense de letras lembra que David, além de professor e homem de marketing, é sobretudo escritor. E mais que isso, enraizado. Marcou e marca presença em todos os movimentos literários de Joinville a partir da década de 1974.

Movimento da confraria, associação das letras e na Academia Joinvilense de Letras, e na Catarinense. Esse engajamento o diferencia.

É vasta, portanto, sua contribuição para a cultura não apenas joinvilense, mas, sobretudo, sul brasileira. E agora, mundo afora.

E aí reside o diferencial de David Gonçalves enquanto escritor. Veio do cabo da enxada. Da lavoura de café da bela Jandaia do Sul. Jandaia do Sul, a exemplo de tantas localidades do Brasil sertanejo, espelha a alma, o essencial do homem do campo. Rudes, mas corajosos; simples, mas arrojados. E, sobretudo ousados. E, por que não?! Cultos. Para o bem ou para o mal, assim foram erguidas as povoações sul brasileiras. A machado e foice, pondo florestas abaixo. E no fio da enxada, capinando quiçaça.

Calha muito bem nesta hora Euclides da Cunha. Como não o evocar. Os Sertões, saltam aos olhos. Não aquele das caatingas ressequidas de Antonio Conselheiro em Canudos, mas sim, da Mata Atlântica, exuberante e generosa. A tríade: a terra, o homem e a luta interagem. A terra é boa demais, o homem é corajoso. E a luta é renhida. Cruel às vezes. Sem tréguas. Embora as agruras, bons frutos saltam aos olhos.

David, como um arguto observador capta esse cenário dispondo-o em obras maiúsculas como: A Flor que o Chapadão Não Deu, O Sol dos Trópicos, Geração Viva, Sangue Verde, Pés Vermelhos, Estação das Trevas. Sangue Verde vai mais longe incursiona pela Amazônia.

A obra literária de David Gonçalves, em termos de conteúdo e mensagem equivale ao que há de melhor na literatura brasileira e mundial. É universal portanto.

Se há os escritores do ciclo da mineração: os poetas das gerais; do ciclo da cana-de-açúcar, no Nordeste; do ciclo do gado nos pampas gaúchos; da chegada da urbanização com Machado de Assis; do setentrião de Guimarães Rosa; há ciclo literário da colonização do sul. E, neste universo, David navega, de longe, de braçada; e, ao lado de Érico Veríssimo, um dos mais representativos.

Certamente, o tempo fará justiça a esse escriba, símbolo vivo da figura do desbravador sul brasileiro. Expoente de vulto, de certeza.

Bom demais ouvi-lo, especialmente no lançamento desta obra primorosa: Algo Rói no Peito. E, ressalte-se, binacional. Em Portugal e Joinville. Vida longa ao amigo.

Joinville, 28 de setembro de 2024

Onévio Zabot
Engenheiro Agrônomo

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