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CAMPO & CIDADE

Caça aos mosquitos - Onévio Zabot

  • - Onévio Zabot - Engenheiro agrônomo e servidor de carreira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) - Membro da Academia Joinvilense de Letras

No momento em que ocorre uma epidemia: doenças transmitidas por mosquitos assolam várias regiões do país, com forte presença inclusive em Joinville - caso da dengue -, cabe uma reflexão sobre os impactos desses insetos no cotidiano das pessoas. Mosquitos: agentes do mal, assim ousam asseverar alguns. Realmente seriam? Eis uma pergunta fatídica.

Nem tanto, pois apenas 6% transmitem doenças. Vetores, portanto. As demais - ao todo são mais de três mil e quinhentas espécies -, alimentam-se de néctar e frutas. E como agentes polinizadores contribuem para o equilíbrio ambiental. Servem de alimento para a fauna silvestre, especialmente para as libélulas, vorazes insetívoras. E morcegos. E tesourinhas.  Entre as espécies prevalece o gênero Aedes, Anopheles, Haemagogus, Culex, e Flebótomo, entre outras.  E a malária, a febre amarela, a dengue e congêneres (zika e Chikungunya) são as doenças de maior impacto social. Apenas as fêmeas, hematófagas, necessitam de sangue para maturar os ovos. Como insetos holometabólicos o ciclo de vida compreende: alados, ovo, larva e pupa.

Uma curiosidade: Ildo Campello - célebre radialista joinvilense - Rádio Cultura AM -, no programa: A Trombeta -, notabilizou-se pela língua ferina. Espada afiada. E sobretudo pelas trombeteadas. A la Chacrinha, vez por outra cutucava a prefeitura sobre o descontrole da praga do borrachudo em Joinville.  Embora não transmitisse doença, incomodava.

Na época, de todos os temas em evidência dois prevaleciam: 1) a abertura do canal do linguado e, 2) o controle do borrachudo, praga que assolava o interior de Joinville. Quanto à abertura do Canal do Linguado a polêmica contínua, pois nada foi levado adiante; quanto ao controle do borrachudo, graças à ousadia do Vereador Arnor Vogelsanger, do prefeito Luiz Henrique da Silveira e de nossa modesta contribuição, a questão foi equacionada. Buscamos luz em São Sebastião, litoral de São Paulo. E também em pesquisas da EMPASC, hoje Epagri. Até uma espécie endêmica foi identificada; denominada Simulium empascae.

Antes disso, porém, um fato marcante: em sessão da Câmara de Vereadores Arinor fez questão de contar o número de borrachudos capturados na região do Vila Nova. Quase quinhentos insetos por hora. Recorde mundial viemos a saber mais tarde, pois até então prevaleciam estatísticas de Portugal, Comporta. Quatrocentos borrachudos/hora. Instrumento aferidor: rede de captura dupla face. Em pontos adrede escolhidos recolhiam-se alados. E, sob lâmina de lupa, contavam-se. Antes disso, no entanto, aferia-se in loco.  Isca viva". Perna exposta, quinze minutos, alados picantes, devidamente contados.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendava: o nível ideal de tolerância - situação não incomoda -, menos de dez insetos alados por hora. Na época, portanto, era crítico o cenário em Joinville. A sorte, embora o incomodo, não hospedar patógenos. Caso da África onde transmite a oncocercose, cegueira dos rios.

Recentemente foi publicado um livro instigante sobre mosquitos: "The Mosquito. A Human History of Our Deadliest. Traduzindo: O Mosquito: Uma História Humana do Nosso Predador Mais Mortal de Timothy C. Vinegard.

Dados ali contidos falam por si só. Da população do mundo em todos os tempos - cerca de 108 bilhões indivíduos -, quase metade, 52 bilhões pereceram vítimas de doenças transmitidas por mosquitos. Assustador, não. E elenca: sucumbiram em face da voracidade da praga, 1) Átila, cognominado o "Flagelo de Deus" no vale do rio Pó, Itália; 2) Alexandre Magno; 3) Alarico, chefe do Visigodos e, 4) e parte das tropas de Gengis Khan, mongol.

Franceses no Canal do Panamá, em razão dos mosquitos desistiram da obra vendendo-a por uma pechincha aos EEUU. Oitenta e cinco porcento dos trabalhadores haviam sido hospitalizados e cerca de vinte e dois mil perderam a vida. Uma tragédia. E destaca: Hitler mandou inundar os pântanos que inundavam Roma e Nápoles como forma de aumentar a proliferação de mosquitos. E assim aterrorizá-los. Alexander Humboldt incursionando pela Venezuela destaca a presença de nuvens de mosquitos. Enxames.  Tantos eram que mal podiam abrir a boca. Trabalhadores da ferrovia Mamoré Madeira no Acre enfrentaram o mesmo drama. E a própria Bíblia em Êxodo aponta os mosquitos entre as pragas que castigaram os egípcios por não liberam os hebreus. Ipsis literis (18 -16): "O Senhor disse a Moisés: Dize a Aarão: Levanta a vara e fere o pó da terra; ela se convertera em mosquitos em todo o Egito. Fizeram assim: Aarão estendeu a mão com a sua vara, feriu o pó da terra; e houve mosquitos sobre os homens e os animais. Toda a poeira da terra se transformou em mosquitos em todo o Egito. Os mágicos usando de seus ensinamentos, tentaram produzir mosquitos, mas não o puderam. Os mosquitos ficavam sobre os homens e animais. Então os mágicos disseram ao faraó: - "isso é o dedo de Deus".


A coisa vem de longe, portanto. De muito longe mesmo, pois os mosquitos conviveram com os dinossauros.

E, somente com a descoberta do DDT, houve um certo alívio. Mas fatores ambientais denunciados na obra A Primavera Silenciosa de Rachel Carson, suspenderam a utilização dos clorados. Resíduos permaneciam na gordura, caso do leite, e no caso das águias - símbolo americano -, comprometiam a formação da casca do ovo.

 A Organização Mundial da Saúde tem vasta e experiência no setor. Varias vezes Joinville buscou subsídios na organização, inclusive quanto ao emprego de fosforados (Abate 500). O problema somente foi d contornado após a utilização de um produto de origem biológica, o Bacillus Thuringiensis, cepa israelenses (BTI).  Antes disso, porém, agroquímicos foram testados, tentativa de aliviar a incidência da praga.

Quanto ao monitoramento, via de regra, era realizado com a chamada "isca viva. Uma pessoa em locais escolhidos expunha e perna por quinze minutos, e contava os alados sugando-o. Situação incomoda, obviamente. Mais tarde foi substituída pelo puçá, nada mais do que pequena rede para capturar insetos.  E aí a curiosidade. Arinor Vogelsanger ciente da metodologia aplicou-a, e levou a amostra numa sessão da Câmara de Vereadores, fato que provocou imensa curiosidade dos pares e de demais presentes. E, olha, na época o maruim não incomodava. Hoje, preocupa especialmente os turistas que se dirigem ao campo. Mais um desafio, portanto.


Ah, em tempo: afirma-se que a maior quantidade capturada por hora de mosquitos ocorreu em Portugal, localidade de comporta. Ledo engano. Em Joinville a captura feita por Arinor foi bem maior.

É evidente que há outros métodos de controle, entre os quais a esterilização de machos, prática adotada com êxito nas ilhas Caimão pela universidade de Oxford. Redução de 96% da praga.

Registre-se por fim: a SUCAM (Superintendência de Campanhas de Saúde Pública) que atuou por longo período no país fez um trabalho de fundo nunca substituído à altura. Urge, portanto, repensar as medidas de controle em curso, especialmente no que tange ao efetivo envolvimento da população no processo. Integração interinstitucional. E mais pesquisa. Mão à obra, portanto.

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