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As Cigarras de JK
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- Onévio Zabot - Engenheiro agrônomo e servidor de carreira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) - Membro da Academia Joinvilense de Letras
Da redação - Onévio Zabot - 22/10/2022 - 17h26min - Brasília, primavera de 2022, segunda quinzena de outubro. Calor escaldante, pero no tanto. Temperaturas mais agudas país afora. Sazonalidades. Estiagem no Cerrado, natural.
Ciclo das estações, duas apenas: verão e inverno.
Os gramados, sensíveis - ressequidos -, clamam por água do céu. Melhor das nuvens, dos rios aéreos. Secaram os rios aéreos, no entanto: a providência: caminhões pipa, mas sequer fazem cócegas os caminhões pipas. Borrifadas ao vento. Vapor d'água. E chuva mesmo,nadinha; apenas nuvens engasgadas ao alto, se presentes. Enxutas, evaporam. No mais, azul a
perder de vista.
A boa notícia, no entanto: o serviço de meteorologia alerta: ufa! a tão esperada chuva - período das águas -, chega nos dias vindouros. E Paulo, informa:
- É chover é tudo verdeja rapidamente. As raízes, como que adormecidas, aguardam para mostrar a que vieram: projetar "o verde que te quero verde", de Lorca.
Mas cá entre nós: supressas não faltam na capital-esperança. E imaginar que surgiu a partir de um sonho de Dom Bosco. Custamos acreditar. Mas é real. E, é claro, consubstancia-se com o ímpeto de Juscelino Kubistchek de Oliveira. Carisma sobrava nele. E coragem,certamente.
Em poucos momentos de nossa história, uma plêiade de homens ousados e criativos uniram-se em torno de um ideal. E, mais do que no próprio projeto piloto, percebe-se isso no cheiro de terra e de mata e de água corrente ao visitar o Catetinho - rústica morada
inaugurada em 1956. Idealizado por Niemeyer e JK: confabulações no Jucá's Bar, hotel Amassador, RJ. Palácio das Tábuas, provocação de Dilermando Reis; servia de abrigo para a JK e sua equipe quando na nova capital.
Preservado e recuperado pelo governador Ibaneis Rocha, retrata a simplicidade de JK e sua equipe: Bernardo Sayão e Israel Pinheiro, homens de ação; Niemeyer e Lúcio Costa, designers de traços arrojados e curvas refinadas. Simples, porém, de elegância superposta.
Andares e ares mascados de mato. O ambiente nos sensibiliza. Sala de reuniões (aconteciam até altas horas), cozinha ampla (fogão à lenha, mesa pródiga). Quartos. Lamparinas. E o Bar.
Sobras de pinga na prateleira, a famosa Pirassununga, testemunha folguedos. Ali Vinicius de Moraes, Tom Jobim e Dilermando Dias enredaram cancioneiros. Água de Beber: "É água de beber, camará/É água pura? Pode beber". A inspiração: a pequena nascente, olho d'água que jorra aos borbotões ao fundo, na mata. Visitantes ilustres estiveram por ali, no Palacio das Tábuas: Rainha Elizabeth II, Craveiro Lopes, presidente de Portugal e até o então prefeito de Nova York.
Deslumbramentos à parte, hoje, temos muitas Brasílias; percebe-se claramente. Basta percorrê-la; o que não é tarefa simples, desvendá-la. Prevalece, no entanto, o vazio. Espaços amplos. Terra de ninguém. Sensação de deserto à flor da pele. A rigidez do plano diretor,segundo a arquiteta Júlia, inibe diversificações. Utilidades. Convívio, enfim. Policentrismo,palavras do saudoso prefeito de Joinville Luiz Henrique da Silveira, muito pouco disso por ali. Ariano Suassuna ousou questionar a arquitetura da capital. À associa a catatumbas - caso de algumas edificações no projeto piloto. Ovaladas, contrariam a paisagem do cerrado, ampla e aberta. Repleta de mananciais. Córregos e riachos - malha hídrica. Benevolência da natureza.
Cabeceira d'águas ora se dirigem ao norte - Amazônia -; ora, ao sul - Rio Paraná. Obra prima da mãe natureza, geologia secular. Nesse frenesi todo, chama a atenção: o grandioso projeto de cobertura arbórea do Distrito Federal. E por que não, os ajardinamentos. Raimundo Oliveira Silva, diretor de parques e jardins da NOVACAP, aponta números surpreendentes: 1) quatro milhões de árvores
plantadas; 2) quinze porcento das quais frutíferas; 3) mil canteiros de flores de época; 4) 1860 hectares de gramados. Um hectare - dez mil metros quadrados -, equivale a um campo de futebol. E ainda para o corrente exercício, sessenta mil árvores serão plantadas. A maioria ipês, nativos do Cerrado. Cultivam nove tipos de ipês amarelos. E cinco do roxo. Isso mesmo. Mas é claro: há o branco, o roxo, o rosa, felpudo e o verde.
Essa ação vem desde a fundação da capital. Dois viveiros: I e II respectivamente, operam como âncoras. O primeiro produzindo flores e forrações. Caixaria basicamente. E o segundo, mudas de árvores. Algumas de espécies tombadas como: copaíba, sucupira-branca, pequi,cagaita, buriti, gomeira, pau doce, aroeira, embiriçú, peroba, jarandá e Ipês. Ao todo, em ambos os viveiros são produzidas mudas de cerca de cem espécies. Mas já chegou a trezentas, afirma Raimundo. Algumas não se adaptaram. Resistem ao manejo. O geógrafo Rodrigo - do Viveiro I -, não esconde a satisfação de lidar com plantas. E vai elencando as etapas necessárias: 1) coleta de sementes; 2) laboratório; 3) estocagem; 4) semeadura; 5) repicagem e por fim, 6) o plantio, esse terceirizado. E mulheres do presídio atuam nas operações.
Percebe-se nelas um ar de aconchego, de contribuir para o embelezamento e o bem estar da cidade. Ambiente com energia positiva. Alto astral. Aderaldo, mestre com dezenas de anos de estrada, ao falar sobre o viveiro, como bom capixaba, vibra. Olhar cativante. Rodrigo faz questão de enfatizar: sabe tudo sobre plantas Aderaldo. Vive com elas e para elas. Gratificanteisso, penso cá com meus botões. E uma senhora, cujo nome não me ocorre, simpática e acolhedora, descontrai o grupo com sua naturalidade - sabedoria de boa candangueira. Consultora informal, esbanja simpatia.
No viveiro II, a técnica Adriana, comanda a produção de mudas árvores. Trabalho gratificante. Mudas de todos os portes. Sessenta mil prontas para ir a campo ainda este ano. E caminhões carregados de galhadas resultante de podas - e muitas toras -, adentravam ao viveiro. Depósito a perder de vista. A galhada vira composto orgânico, usado na adubação de canteiros; e os troncos vão leilão, informa Adriana. Nesse interim coletores de sementes retornavam do campo. Coleta farta. Fardo delas. O calendário é continuado, coletam o ano todo.
E Brasília surpreende também no rural. Produções orgânicas avançam. E sobretudo no turismo rural. O Circuito da Rajadinha - menina dos olhos da turismóloga Zaida da Silva de Emater-DF -, a joia da coroa. Onze famílias de Planaltina uniram-se oferecendo um leque
abrangente de atratividades, todas vinculadas à agricultura familiar. O projeto iniciado em 2016, um sucesso, informa Zaida, sem esconder o entusiasmo. E a Feira da Colônia, realizada anualmente, oferece palestras e também oficinas, onde o visitante aprende a fazer fazendo. Caso de arranjos florais. E produtos da gastronomia regional enriquecem e, sobretudo, atraem novos visitantes. Tudo produzido nos sítios, sob orientação da Emater-DF.
Coincidência das coincidências a EMBRAPA Hortaliças promovia naquele momento mais uma etapa da feira: Jovem Pesquisador do futuro. Estudantes da rede de educação tendo oportunidade de conhecer os trabalhos de pesquisa em hortaliças. Uma espécie de tomate resistente à seca despertava a curiosidade dos presentes. Origem: altiplanos peruanos. Nem parecia tomate. Os gen de resistência à seca, por diminuir o consumo de água, interessa, portanto, e muito, informava o jovem mestrando. A unidade opera como âncora, associadas a outras distribuídas pelo país e também interagindo como setoriais estaduais, caso da Epagri em SC.
De partida e de alma lavada, o canto das cigarras se espalha no ar: viva orquestra; pressentimento de chuva, alegam. Meus netos: Antonio, João e José, amam essas pequeninas e atrevidas cantoras. José catou uma delas no apartamento.
Certamente, cantam as cigarras de alegria. Evocam JK, esse bravo timoneiro das Minas Gerais que ousou fincar um pé no planalto central. E mais que isso, estabelecer moradia. Consolidar nossas fronteiras; integrar nossa pátria, um senhor desafio. E Francisca, então, teatróloga, porém na real zeladora atuando na Câmara Federal, conhecê-la que grata surpresa. Amor de gente. Paixão à primeira vista.
O sotaque dos brasilienses de raiz ou de chegada não negam o caldeamento intergeracional. Metaraça, palavras de Gilberto Freire. Não resta a menor dúvida: Brasília é e sempre será a capital da Esperança.
Alvissarás!
Joinville, 22 de outubro de 2022
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