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CAMPO & CIDADE

Sicômeros de Amós

Amós, profeta vaqueiro e cultivador de sicômoros. Nada mais do que isso, argui Miguel Angel Pons na obra: História da Agricultura (Editora Maneco, 2008). Instigante livro. Linguagem concisa. Sabedoria milenar.

O engenho humano... ora desafiá-lo?! Leituras da Bíblia, quantas leituras, mas esta do profeta Amós, por Deus! que grata surpresa.
Destaca-se, entretanto, o profeta. Cobra das autoridades de então. - Jeroboão II, (781-741 a. C. “Que o direito corra como a água e a justiça como rio caudaloso”. Escandalizado, disse: “Vos transformais o direito em veneno e o fruto da justiça em absinto”. Mesmo assim, insistia (Amós 7:14): “ Não sou profeta, nem filho de profeta eu sou vaqueiro e cultivador de sicômoros”.

O livro arrola fatos surpreendentes, como um caleidoscópio, prospecta horizontes históricos. Suor e lágrimas. E sagas. Oh, quantas
lágrimas! Mas não só lágrimas, também alegrias. Regozijos. Festejos e bem fasejos. Pródigas safras. Abundância.

Mas, sobretudo destaca o papel da educação e da tecnologia, assim como das inovações, como fatores chave. Decisivos, mesmo. Não esconde a admiração pelos ameríndios, os Incas, por exemplo, que cultivam 77 espécies diferentes de milho, cuja cor do grão variava do amarelo ao branco, do laranja ao roxo, e do marrom ao púrpuro.

Do Egito reporta-se ao nilômetro, método utilizado para monitorar o nível do rio. Nas cheias ou nas estiagens permitia, assim, o manejo da irrigação. E o Manifesto - Discurso do Camponês (2100 a. C) - a pérola.
Insta os funcionários do governo à responsabilidade: “ 1) Agir como pai dos órfãos, marido das viúvas e irmãos dos abandonados; 2) prevenir o roubo e proteger o miserável; 3) executar a punição dos que merecem; 4) julgar imparcialmente e não afirmar falsidades; 5) promover um estado de harmonia e prosperidade em ninguém possa sofrer frio, fome ou sede”.

Certamente cultivar os campos, vivenciá-los, torna-los produtivos, eis algo notável, pouco perceptível, no entanto, especialmente
no que tange às gerações atuais, alienadas, o que, infelizmente, lhes oculta essa percepção: a linha do tempo. Cenários do antes, do agora e por que não do depois. Vitais obviamente.

Nesta hora vem-me à mente Tsiolkolsky, pai da cosmonáutica russa.

– “Tudo que o homem sabe, e tudo o que vier a saber, é nada diante do que nunca saberá”. E, emenda: “A terra é um berço e, nela,
ninguém permanecerá para sempre”.

Atém-se longamente Pons sobre a origem das plantas cultivadas. As principais, claro. E elenca os cientistas, destacando descobertas
cruciais. Entre tantos destaca Darwin, não apenas pela monumental obra: Origem das Espécies(1865), mas também por outras duas: 1) Fertilização e Autofecundação no Reino Vegetal, e 2) A Formação do Terriço pela Ação das Minhocas. Do primeiro trabalho resultaram mais tarde a produção de híbridos, claro acrescido pelas pesquisas de Mendel, pai da genética.

Reserva um capítulo especial ao desenvolvimento de ferramentas e máquinas. À engenhosidade humana, portanto. Do arado primitivo ao avião agrícola, sem dúvida, um passo gigantesco. A entrada do trator em 1906, outro marco histórico.

Dedica ampla consideração aos Malais, horticultores franceses na periferia de Paris. Ali, o esterco de cerca de 100 mil cavalos fazia toda a diferença. Compostavam a campo. Matéria prima de primeira.

Quanto à colonização da América do Norte é taxativo: duas medidas foram fundamentais para o desenvolvimento rural(1862): 1) o
Homestead Act (distribuição de terras); e o The Merril Act (rede de colégios agrícolas - Landgrat Colleges).

À Dinamarca rende um capítulo à parte, graças à força do cooperativismo. O país superou desafios (solos paupérrimos) e fez da
pecuária leiteira e da suinocultura um baluarte. Daí considerar a vaca a “Ama da Humanidade”. E o café com leite o elixir dos deuses.

A questão ambiental, a abordada, especialmente quanto à conservação do solo e da água. Cita o evento que marcou os EEUU em
1943, “A Grande Bacia de Pó.” Ventos arrastaram o solo exposto cobrindo os céus do oeste americano. Uma tragédia sem precedente. Fato que provocou uma mudança radical no manejo do solo.

Quanto ao sicômoro, uma curiosidade: trata-se uma figueira (Ficus sycomorus), cujos frutos, embora pequeninos, dada a abundância, nas regiões áridas, saciam a fome das populações. Daí o profeta Amós, embora vaqueiro, cultivá-los.

Eis um livro sobre todos os aspectos, instigante.

Joinville, 3 de janeiro de 2024

Onévio Zabot

Engenheiro Agrônomo

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