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Coluna das Artes

Os Retirantes - Elisa Silva

  • Divulgação - (Os Retirantes, 1944, MASP)

Os Retirantes (1944), além do nome do quadro a ser analisado, é como se chama uma série de pinturas*, as quais narram a história de uma família que abandona o nordeste em razão da seca para tentar a sorte na região sudeste. Apesar do quadro ser da década de quarenta, o drama apresentado é vivido por centenas de famílias até os dias de hoje. A seca ainda é um flagelo.

O quadro pertence ao gênero retrato e a impressão que temos ao olhar a pintura é que a família de fato posou para um retrato. Um retrato da miséria. Na composição vemos um senhor muito idoso que caminha apoiando-se em um cajado e com um olhar extremamente sofrido, dois adultos que devem ser os genitores e os filhos, crianças de todos os sexos e idades, inclusive de colo.

A mãe equilibra na cabeça uma trouxa de coisas e o pai carrega outra com os parcos pertences da família. As duas meninas que estão ao lado do pai, assim como o menino que segura a sua mão, têm olhares de desalento. O pai com os olhos bem abertos teme o futuro. Com razão!

As figuras são representadas de forma tão rígida quanto o chão que elas pisam, uma terra seca permeada de pó, pedras e ossos de animais e pessoas que tentaram fazer a mesma travessia. O fundo é composto pelo entardecer com o céu pintado em vários tons de azul, a lua que brilha e centenas de urubus espreitando a tragédia anunciada.

A pintura retrata o exílio, o desalento, a tristeza, em uma nomenclatura moderna são refugiados. Refugiados da seca e da fome. É um quadro de denúncia, como vários outros que Candido Portinari produziu.

No início Portinari (1903-1962) desejava criar uma pintura com características nacionais, a exemplo do seu antecessor Almeida Júnior (1850-1899), porém ele superou o regionalismo de Almeida Júnior e criou uma obra de caráter nacional e moderno, engajada com o seu tempo e com as questões sociais que assolavam o país na época, seus quadros são retratos políticos e sociais do seu povo.

Segundo esse artista uma pintura desligada do povo não é arte. Para Candido Portinari toda arte deve ser engajada e assim foi por toda sua carreira, pois ele variou entre muitas técnicas, porém a temática sempre foi o brasileiro e as questões sociais e históricas que o envolvem.

Ao analisar as obras de Portinari é possível imaginar o que ele pintaria nos dias atuais, seriam os refugiados, os moradores de comunidade, os negros que são humilhados pela truculência policial neste Estado de coisas que o Brasil se tornou. Possivelmente, ele pintaria os refugiados da pandemia, pois enquanto uma classe média cega anseia por diversão um povo sofrido anseia por comida na mesa.


Elisa Silva - especialista em História da Arte e autora dos livros " Paris sonho meu" e " Paris - Uma viagem impressionIsta"



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