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CALIGRAFIA DE MARINA

CALIGRAFIA DE MARINA

ELEGÂNCIA - Marina Martins

É fácil confundir elegância com ser chique, usar roupas caras ou ter dinheiro. Em frases como "Elegância vem de berço" temos junto a ideia de que a elegância não apenas tem nome, como certamente tem sobrenome também. Graças ao poder imagético da televisão, imaginamos jantares servidos por serviçais, pessoas vestidas no seu mais fino traje, falando baixo e apenas sorrindo (quer algo mais deselegante do que rir alto e chamar atenção?). Para mim, por muitos anos, o sinônimo de elegância era uma antiga professora da faculdade, uma senhora petit, que usava um lenço nos ombros e escrevia no quadro, sem que esse lenço sequer se movimentasse. Com que graça ela fazia isso! E nem preciso dizer que sua voz era também comportada como seu lenço. Outro representante na minha lista da elegância era andar de salto com maestria. Não rebolando, não andando feito pato, apenas deslizando. Não importa qual fosse a altura do salto ou sua finura. 

Tempo vai, tempo vem, nossos padrões vão também se modificando. É possível que, nesse quesito, muito de minha personalidade possa ter influenciado. Dona de uma voz bastante potente, de gaitadas frouxas e abraços apertados, nunca achei que me enquadrasse no princípio da elegância. Mas acontece que comecei a perceber que ser elegante na verdade, pouco diz respeito ao seu modo de vestir ou ao tom da sua voz. Ser elegante é adaptar-se. É sentir-se à vontade em qualquer situação, seja ela da classe mais alta à paupérrima. Na verdade, mais importante ainda, é também deixar quem está a sua volta à vontade, acolhido, pertencendo. E essas características são muito mais valiosas que o valor de qualquer roupa cara. Buscando exemplos práticos, a pessoa elegante é aquela que, quando recebe alguém, tem o cuidado de adaptar sua refeição às restrições alimentares dos convidados (na medida do possível, claro). Pense como é bom você ser intolerante a lactose e seu prato vir sem o molho branco? Ou um vegetariano que ao invés de apenas comer a salada tem um suflê de legumes feito para si? Isso sem que pedissem, claro. Ser elegante é saber dizer para alguém que tem algo em seu dente, sem que essa pessoa se sinta constrangida, mas também sem que passe vergonha mostrando seu almoço no sorriso. Ser elegante é garantir sempre uma pequena gorjeta para quem presta serviço para você, algo que não estava combinado mas que não pese no seu orçamento, e fazer isso sem ser de modo ostensivo, para que a pessoa apenas se sinta valorizada e não humilhada. 

Do mesmo modo, também podemos ser amigos elegantes. Na maneira como dizemos algo que seja importante e duro para um amigo, de forma que ele sinta que estamos cuidando e não julgando. Ou no próprio carinho que temos com eles. Em fazer um pequeno agrado sem que seja seu aniversário. Num presente cuidadoso que se escolha, porque você sabia que era a cara daquele amigo. Ou simplesmente em ouvir. Há algo mais elegante do que ouvir atentamente alguém? No mundo de hoje estamos tão cegados por nossos próprios egos e mazelas, queremos tanto ter voz, que ter alguém que nos ouça com carinho e atenção, se importando de fato com o que dizemos, é por certo algo de muito valor. Pensando nos tempos de agora, se é para existir um novo normal, que seja o da elegância. Não de máscaras que combinam com sua roupa, mas elegância de cuidado, de atenção, de empatia, de zelo genuíno pelo bem estar do outro.


Marina Martins é formada em letras português, inglês e literaturas e atua como professora de línguas no Instituto Federal Catarinense, em São Francisco do Sul. Sua incursão em uma escrita sistemática iniciou-se junto com as transformações da pandemia: criou o blog de crônicas vaguidaoespecífica.blogspot.com.br. Afinal, a literatura não poderia ser melhor maneira de transformar o real.





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