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Japão quer acabar com pacifismo militar adotado após derrota na Segunda Guerra

  • Terra -

Após vitória de seu partido nas eleições legislativas, primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, quer promover reforma constitucional do artigo 9º da Constituição, que restringe uso da força militar.

Era uma das principais plataformas políticas de Shinzo Abe, o ex-primeiro-ministro do Japão que foi assassinado neste mês. E agora há uma chance de que ela possa virar realidade.

Depois de uma vitória retumbante nas eleições legislativas no Japão na semana, o primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou que pretende promover uma reforma da Constituição e aprofundar o debate sobre as medidas necessárias para "fortalecer drasticamente" a defesa do país em meio a um clima difícil de segurança.

A proposta de reforma, que há anos vinha sendo defendida sem sucesso por Abe, significaria a primeira mudança na Constituição japonesa desde sua promulgação, em 1947. O governo quer mudar o simbólico artigo 9º, cujo texto estabelece que "o povo japonês renuncia para sempre à guerra como direito soberano da nação e à ameaça ou uso da força como meio de solução de disputas internacionais".

A iniciativa desperta resistência tanto dentro como fora do país, apesar de supostamente procurar apenas consagrar a constitucionalidade das Forças de Autodefesa do Japão (como são conhecidas as forças militares do país).

Mas por que a reforma gera polêmica?

Mudança histórica
"Para entender o significado da Constituição no Japão, é importante voltar à história deste país após a Segunda Guerra Mundial. As autoridades de ocupação dos Estados Unidos ajudaram a escrever a Constituição do pós-guerra que se tornou lei em 1947", diz John Nilsson-Wright, professor de Política Japonesa e Relações Internacionais na Universidade de Cambridge, à BBC News Mundo (serviço de notícias em espanhol da BBC).

"Essa Constituição não foi alterada ou emendada sequer uma vez desde que foi introduzida pela primeira vez e é vista por muitos conservadores no Japão, com ou sem razão, como algo estranho, que não serve como documento soberano de uma nação soberana. A questão da emenda, portanto, é para muitos da direita no Japão um assunto pendente da Segunda Guerra Mundial", diz.

Mas enquanto a direita quer reformar a Carta Magna, a esquerda teme que o texto seja alterado.

"A Constituição é vista pela esquerda como garantia da cultura política democrática do Japão, e o fato de que ela foi introduzida pelo lado vencedor da guerra (os EUA) tem sido visto pela esquerda como prova de que o Japão havia abandonado o militarismo do período anterior à guerra. Por isso, tem sido uma questão política tão explosiva", explica o professor.

David Boling, diretor de Japão e Comércio Asiático da consultoria Eurasia Group, aponta que a experiência da Segunda Guerra Mundial foi tão ruim para o Japão que muitos de seus cidadãos concluíram que a guerra, em geral, é um desastre e, por isso, o país desenvolveu uma tendência pacifista.

"No Japão, há muitas pessoas que se orgulham muito da Constituição. Muitas vezes se referem a ela como a Constituição da Paz de maneira muito positiva. Portanto, há um grupo interno que se sente orgulhoso desse texto", afirma.

Do pacifismo à autodefesa
Entre os críticos da possível reforma constitucional, há preocupação de que o governante Partido Liberal Democrático (LDP, na sigla em inglês), ao qual pertencia Abe e agora é liderado por Kishida, queira eliminar as restrições à força militar previstas no artigo 9º da Constituição.

De acordo com Sheila Smith, pesquisadora de estudos da Ásia-Pacífico no Council on Foreign Relations (uma consultoria com sede em Washington), não é isso que está sendo considerado atualmente.

"As propostas atualmente apresentadas pelo Partido Liberal Democrata não preveem a eliminação do artigo 9º, mas simplesmente a sua modificação para acrescentar outra frase", afirma.

"Certamente há algumas pessoas dentro desse partido que querem ir mais longe e mudar o nome das Autodefesas ou coisas assim, mas não há nenhuma proposta no momento para se livrar do artigo 9 e isso não tem apoio nem no LDP e nem entre os cidadãos. Mas os críticos se concentram no artigo 9 porque é uma parte central da identidade japonesa do pós-guerra."

Ele explica que embora ainda não haja um texto concreto em discussão - apenas ideias - até o momento a proposta sugere que reconhecer a natureza constitucional das Autodefesas para deixar claro que elas são consistentes com a Carta Magna.

A Constituição do Japão, aprovada durante a ocupação americana, procurou eliminar qualquer possibilidade de remilitarização do país, expressando literalmente que "nenhuma força terrestre, marítima ou aérea será mantida no futuro, nem qualquer outro potencial bélico".

Mas ao longo dos anos essa proibição literal foi sendo reinterpretada e adaptada às mudanças do contexto internacional.

David Boling ressalta que as Autodefesas vêm mudando progressivamente porque durante décadas elas eram apenas um órgão do governo. Depois foi criado o Ministério da Defesa e, posteriormente, durante o governo Abe, foi estabelecido um Conselho de Segurança Nacional dentro do gabinete do primeiro-ministro para coordenar as políticas de segurança.

Uma das grandes mudanças nesse sentido ocorreu em 2014, quando o governo Abe promoveu uma reinterpretação da norma constitucional que fala da defesa do país.

"O gabinete de Abe aprovou uma reinterpretação do artigo 9 que dizia que as Forças de Autodefesa Japonesas - se necessário para a segurança e sobrevivência do Japão - poderiam usar a força em nome de outras nações como os EUA ou a Austrália, por exemplo. Foi uma reinterpretação muito cautelosa", diz Sheila Smith.

No ano seguinte, uma nova lei foi criada com base nessa reinterpretação. Assim, as Autodefesas obtiveram a possibilidade de usar a força em apoio a outros países se fosse necessário para a segurança do Japão.





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