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Briga sobre 'herança racista' na Suécia inclui 9 crânios brasileiros

  • BBC - Instituto Karolinska abriga uma macabra coleção de quase 800 crânios humanos

O prestigiado Instituto Karolinska da Suécia, que todos os anos elege o vencedor do Prêmio Nobel de Medicina, abriga em suas instalações uma macabra coleção de quase 800 crânios humanos - e nove deles são do Brasil.

Removidos de túmulos em diversas partes do mundo, os crânios foram utilizados entre os séculos 19 e 20 pelos cientistas suecos Anders e Gustaf Retzius - pai e filho - em controversos experimentos associados às teorias do racismo científico da época, que preconizavam uma suposta superioridade do homem branco.

"Sob a perspectiva atual, reconheço que uma parte dos 200 anos de história do Instituto Karolinska pode ser considerada racista", disse à BBC Brasil o reitor da instituição, Ole Petter Ottersen. "No século 19, professores e pesquisadores do instituto foram influenciados pela ordem colonial dominante. Alguns deles cometeram atos ou expressaram opiniões caracterizadas atualmente como antiéticas, anticientíficas e racistas - algo totalmente inaceitável nos dias de hoje".

Trata-se de uma "herança racista do Karolinska", destacam estudantes da instituição: eles exigem não só um pedido público de desculpas, como a remoção imediata dos nomes de Anders e Gustaf Retzius de salas e laboratórios do instituto batizados em sua homenagem.

A revolta estudantil é mais um ato do movimento internacional contra rastros de racismo e colonialismo em universidades e outros espaços públicos, deflagrado na esteira da onda de protestos de 2020 contra a morte, nos Estados UNidos, do afro-americano George Floyd sob o joelho de um policial branco.

Caçada de crânios
Anders Retzius (1796-1860) e seu filho Gustaf Retzius (1842-1919) foram, em seu tempo, eminentes anatomistas de fama internacional. Seus experimentos eram baseados na crença, então amplamente difundida, de que existiam diferentes "raças humanas".

Reitor do Karolinska por três décadas durante o século 19, Anders Retzius tornou-se conhecido por suas teorias pioneiras no campo da craniologia, o estudo das características métricas e morfológicas do crânio humano. Ele inventou o índice cefálico para a medição de crânios, como uma indicação da raça à qual um indivíduo pertenceria. E passou a classificar os crânios de acordo com seu tamanho e detalhes de seu formato.

Os povos nativos da Lapônia - região que compreende partes do norte de Suécia, Noruega e Finlândia e noroeste da Rússia -, por exemplo, foram caracterizados como portadores de crânios pequenos, "curtos". Já os povos nórdico e germânico teriam crânios maiores, "alongados" - o que era considerado sinal de inteligência superior.

Em prol da tese, pai e filho tornaram-se colecionadores de crânios humanos, em uma caçada que incluiu métodos ilegais e antiéticos. Centenas de crânios foram saqueados de túmulos por intermediários - colegas, aventureiros e outros contatos dos Retzius - em locais de sepultamento em regiões como América Latina, África e Caribe.

A coleção do Instituto Karolinska inclui 400 crânios humanos obtidos fora da Europa - entre estes, estão 240 crânios provenientes de países como Brasil, Peru, Argentina, Egito e Rússia. Quase 200 crânios foram coletados na própria Suécia, e outros 200 foram trazidos de países também europeus. Grande parte da coleção, segundo afirma a instituição, é originária de sítios arqueológicos datados de centenas ou milhares de anos.

Brasil
Oito dos nove crânios provenientes do Brasil foram enviados ao Instituto Karolinska pelo professor de anatomia inglês Jonathan Abbot (1796-1868), no período entre 1847 e 1850. Abbot viveu durante anos em Salvador, na Bahia, onde chegou a trabalhar como cirurgião-chefe no hospital da Santa Casa de Misericórdia.

Segundo correspondência entre Abbot e Anders Retzius, registrada nos arquivos da Academia Real de Ciências da Suécia, seis destes oito crânios são de índios brasileiros mortos durante conflito armado entre grupos indígenas e colonos no interior da Bahia, no fim da década de 1840.

"As cartas revelam que Anders Retzius tinha interesse específico em obter crânios da população indígena brasileira. Mas Jonathan Abbot enviou também dois crânios pertencentes a africanos escravizados da região", disse à BBC Brasil o professor Olof Ljungström, chefe da Unidade de Investigação e Documentação das coleções de anatomia do Instituto Karolinska.

O nono crânio brasileiro da coleção do Karolinska foi coletado pelo naturalista alemão Georg Wilhelm Freyreiss (1789-1825), que viveu no Brasil durante 12 anos no início do século 19. Freyreiss esteve em contato direto com tribos indígenas de diferentes etnias, e escreveu diversas obras sobre suas viagens pelo Brasil e suas observações a respeito dos habitantes nativos.

De acordo com o professor Olof Ljungström, o crânio pertence a um indígena e foi coletado por Freyreiss no período entre 1821 e 1825, durante uma de suas expedições. O alemão conduziu suas explorações principalmente na região de Minas Gerais, segundo Ljungström.

Fundador da Colônia Leopoldina (atual Helvécia) - a primeira colônia alemã do Brasil, situada no sul da Bahia -, Freyreiss foi casado com uma brasileira, e deixou um filho. Ele morreu no Brasil, aos 36 anos de idade.

"Não sabemos precisar com exatidão a que tribos ou etnias indígenas os crânios pertencem. O crânio coletado por Freyreiss está rotulado como 'índio botocudo', mas os relatos do alemão indicam que ele nunca interagiu com nativos desses grupos, e pode ser que o rótulo, datado de 1892, tenha sido adicionado mais tarde em Estocolmo", diz Ljungström.

"Os seis crânios de indígenas enviados por Jonathan Abbot estão rotulados como 'índios tapuios'. Mas a origem específica dos crânios não aparece em nenhuma informação fornecida por Abbot. É possível que o rótulo também tenha sido acrescentado mais tarde, em atribuição àquele que era considerado o grupo indígena dominante na região na época", acrescenta ele.

Em um depósito do campus do Karolinska em Solna, na região metropolitana de Estocolmo, a coleção de 789 crânios humanos está armazenada em caixas de papelão dispostas em prateleiras.

Uma delas traz a inscrição "Escravo negro - Bahia". Em outra caixa, lê-se "Índios Ona" - em referência ao povo indígena Ona (também conhecido como Selknam), originário da Terra do Fogo. São crânios removidos da região pelo explorador sueco Otto Nordenskjöld, durante uma expedição ao extremo sul da América do Sul em 1898.

Há cem anos, a coleção de crânios era um símbolo de status e das ambições científicas do Instituto Karolinska.(BBC)

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